MIGRANTES NA IGREJA DOS ANJOS: Nenhum ser humano é ilegal! 

Há mais de dois meses que mais de uma centena de pessoas migrantes pernoitam à volta da Igreja dos Anjos. São pessoas de diferentes procedências e com situações ligeiramente distintas: há pessoas de Timor, com papéis regularizados e trabalho, e pessoas de outros países de fora da CPLP (Senegal, Gâmbia) a quem foi negado o  requerimento de asilo. Mas todas são pessoas em situação de sem-abrigo que tentam sobreviver, como podem, à falta de habitação e à hostilidade burocrática do sistema de acolhimento de migrantes.

Na quinta-feira passada, a Câmara Municipal de Lisboa, iniciou uma ação que, segundo o comunicado que foi enviado à imprensa, visava “encaminhar e dar resposta a todas as pessoas vulneráveis que ali se encontram, de acordo com o perfil individual e específico de cada uma“. Foram montadas várias tendas e envolvidas várias instituições de apoio social como a Santa Casa da Misericórdia,  Serviço Nacional de Saúde (Unidade Local de Saúde de São José), Associação Comunidade Vida e Paz ou a Junta de Freguesia dos Anjos, assim como a Agência para Integração, Migrações e Asilo (AIMA) e a Polícia de Segurança Pública. No entanto, 5 dias mais tarde, encontramos migrantes a passar fome, desidratados e com necessidade de assistência médica, porque nenhuma destas instituições está a tratar das necessidades mais básicas que qualquer ser humano deveria ter garantidaságua, comida, cuidados de saúde, condições de higiene. Se não estão a fornecer o básico a estas pessoas que eles próprios reconhecem como vulneráveis, qual é o apoio a que a CML se refere?

Eles próprios respondem a esta questão no seu comunicado: “contribuindo ao mesmo tempo para o bem-estar dos moradores daquela zona da freguesia de Arroios, cuidando do equipamento urbano, da saúde pública e dos espaços verdes.” A sua intenção não é outra senão despejar o espaço de pessoas que não ficam bem no postal turístico, e para isso, estão a recorrer à intimidação de pessoas vulneráveis e a práticas ilegais, como as entrevistas sem tradução. 

Mais uma vez a REABILITAÇÃO URBANA COMO INSTRUMENTO DE EXCLUSÃO
Foi colocado um cartaz muito revelador da sua visão daquele espaço. Para estas instituições, as pessoas que habitam este jardim em situação de rua não importam e precisam de ser escondidas.

Enquanto cerca de 140 pessoas dormem em tendas, suportando chuva, frio, calor, sem acesso a alimentos, água, casas de banho, higiene básica, enquanto os seus direitos como migrantes são negados, enquanto são ignorados pelas instituições que deveriam dar-lhes asilo e ajudar na sua integração na sociedade portuguesa, a CML e a Freguesia de Arroios colocam cartazes que prometem “reforçar a iluminação, plantar mais árvores, melhorar o pavimento e reabilitar os sanitários”. Tudo bem, mas há prioridades, e as prioridades das instituições são ativar um protocolo de higiene social e urbana acima da vida das pessoas nas situações mais vulneráveis.

É apenas graças à solidariedade e apoio de coletivos, ativistas, advogados e pessoas sensibilizadas que estas pessoas migrantes estão a ser apoiadas no processo de obtenção de documentos de residência e informadas dos seus direitos. E é apenas a colaboração e articulação entre estas pessoas e colectivos que estão a receber alguma comida e água. Mas não é suficiente. 

NÃO É FICÇÃO, É A REALIDADE E ESTÁ A ACONTECER NA TUA CIDADE
No passado 14 de abril, no âmbito da Festa do Cinema Italiano, teve lugar no Cinema São Jorge a exibição do filme “Eu, Capitão” de Matteo Garrone, filme que fala sobre a travessia de dois jovens de Dakar para conseguirem chegar à Europa. Um grupo de 50 pessoas das mais de 140 que estão a pernoitar no jardim, neste caso, vindas do Senegal, Gâmbia e Guiné, subiram ao palco, onde sempre tiveram de ser recebidas, e voltaram a ser os protagonistas da sua própria história. 

Acompanhadas por activistas, apelaram à solidariedade pública para com as  imigrantes que estão a viver na rua desde fevereiro.

Poucos dias depois de o Parlamento Europeu aprovar o preocupante novo pacto sobre migração e asilo da União Europeia, e num contexto de celebração dos 50 anos do 25 de Abril, é preciso fechar punhos perante o desrespeito pelos direitos das pessoas migrantes. Apelamos à tua solidariedade.

COMO PODES JUNTAR-TE?
Nos próximos dias, está prevista uma operação de despejo no jardim à volta da Igreja dos Anjos, pelo que pedimos o apoio de todas as pessoas:

~ Podes apoiar os piquetes organizados na Igreja dos Anjos ao longo do dia.
~ Podes trazer comida, roupa, água, os teus conhecimentos legais, a tua força, nas inúmeras formas de solidariedade que consigas imaginar.
~ Podes fazê-lo através de um donativo para a conta PT50 0035 0413 0004 5049 730 79, com o descritivo “Apoio imigrantes anjos”.
~ Podes juntar-te à manifestação contra as medidas burocráticas que estão a dificultar a vida das pessoas migrantes, que terá lugar na sexta-feira dia 19, a partir das 16h30, em frente à Junta de Freguesia de Arroios, no Largo Intendente.
~ Podes seguir divulgando os comunicados dos coletivos envolvidos:

@stopdespejos
@habita.colectivo
@pan.teras_rosa
@humansbeforeborders
@redeapoiomutuo
@sosracismopt
@casadobrasildelisboa
@diasporas.pt
@coletivoandorinha

A situação destas pessoas é apenas a ponta do iceberg: há centenas de milhares de pessoas em Portugal que estão a passar por situações semelhantes, que estão a ser vítimas de um sistema deshumano e injusto. 

Stop Despejos! Nenhum ser humano é ilegal! Regularização já!

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